Lucas do Rio Verde, um dos polos de crescimento de Mato Grosso, coleciona desde 2020 um prontuário de horror: oito mulheres perderam a vida pelas mãos de companheiros ou ex-companheiros, em crimes que revelam a face mais extrema da violência de gênero. A sequência de casos corta a cronologia recente da cidade e expõe a urgência de políticas eficazes de proteção.
A tragédia mais recente abalou o município em 24 de junho de 2025. A terapeuta capilar Gleici Keli Geraldo de Souza, 42 anos, foi morta a facadas dentro de casa enquanto dormia; o marido, o engenheiro-agrônomo Daniel Bennemann Frasson, também esfaqueou a filha do casal, de 7 anos, que segue internada em estado grave. Daniel tentou o suicídio, mas foi contido e permanece sob escolta policial.
Pouco mais de um mês antes, em 13 de maio de 2025, a atendente de sorveteria Quitéria dos Santos Costa, 29, foi atacada pelas costas na Avenida Goiás, bairro Veneza. A autora, a ex-namorada Emanuelly Vitória Domingos de Oliveira, 20, foi presa horas depois—imagens de câmeras de segurança captaram todo o ataque.
Na noite de 15 de janeiro de 2024, a cozinheira Francisca Alves do Nascimento, 35, foi esfaqueada quatro vezes pelo ex-marido Marcelo Ochoa de Freitas em frente à rodoviária. Ele foi detido dentro de um ônibus minutos após o crime.
Somente 24 horas depois, Mayla Rafaela Martins, 22, mulher trans, foi encontrada enrolada em lona numa fazenda às margens da MT-485. O empresário Jorlan Cristiano Ferreira, 44, confessou o homicídio, admitindo obsessão pela vítima. Movimentos sociais reivindicam que o caso seja tratado como feminicídio.
No fim de novembro de 2023, a empresária Camila Brito da Silva, 26, atendeu ao portão para um suposto motoboy e recebeu tiros à queima-roupa. O mandante, o ex-marido identificado pelas iniciais E.M.d.S., foi preso em fuga na MT-170; a pistola usada no crime estava no porta-luvas.
Retrocedendo a 10 de dezembro de 2022, a professora Valérie Angelita Petronetto, 48, foi assassinada a golpes de faca pelo namorado Bruno dos Santos Diesel, 28. Ele conviveu com o corpo por dois dias, usou o cartão da vítima e fugiu com o carro dela; acabou preso em Dourados (MS).
Em maio de 2021, a empresária Indiana Geraldo Tardett, 42, teve a morte simulada como suicídio após um ritual forjado. O ex-marido Cláudio Valadares dos Santos encomendou o crime ao “Pai Baiano” Márcio Andrade dos Santos e à cúmplice Jucilene Batista Rodrigues; o trio foi condenado em junho de 2025 a mais de seis décadas de prisão.
O primeiro feminicídio da série aconteceu na noite de 13 de abril de 2020. A paranaense Izabel Cristina Zuanazzi, 38, foi esfaqueada pelo ex-namorado, que não aceitava o término. O agressor feriu a própria mãe que tentou defender a vítima e foi preso em flagrante.
Cifras que doem
Com esse acréscimo, Lucas do Rio Verde soma oito feminicídios consumados em cinco anos, número que iguala a sangrenta estatística de cidades muito maiores. Em todos os casos, a arma do crime—seja faca, revólver ou a premeditação de um ritual macabro—estava nas mãos de alguém íntimo da vítima.
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Romper o ciclo antes da última facada
Nenhum desses assassinatos começou no golpe fatal; todos nasceram de controle, ameaças e violência prévia. Medidas protetivas, canais de denúncia e vigilância comunitária precisam deixar o papel e chegar à porta de cada mulher em risco. Se você souber de alguma situação de agressão:
- Ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher)
- Alerte o 153 em caso de emergência imediata
A memória dessas oito mulheres — Gleici, Quitéria, Francisca, Mayla, Camila, Valérie, Indiana e Izabel — revela como a omissão pode ser tão letal quanto a lâmina ou o gatilho. E lança um ultimato: basta de feminicídios.