A decisão dos Estados Unidos de impor tarifas de 50% sobre a carne bovina brasileira abriu um novo capítulo no comércio internacional de proteínas. O chamado “tarifaço” reduziu a competitividade do Brasil no acesso direto ao mercado americano, mas não impediu que o país continuasse a influenciar fortemente a oferta global.
Com o menor rebanho dos últimos 70 anos, os EUA enfrentam um desafio de abastecimento interno. Para suprir sua demanda, passou a recorrer a fornecedores alternativos no Mercosul — principalmente Paraguai, Argentina e Uruguai. Esses países, por sua vez, direcionaram parte significativa de sua produção ao mercado norte-americano e passaram a recorrer ao Brasil para recompor o consumo doméstico.
De acordo com o levantamento feito pela HN Agro, o Paraguai comprou do Brasil até a terceira semana de setembro/25 1.482 toneladas de carne bovina, isso representa um avanço de 327% frente ao embarcado em setembro/24, que tinha comprado apenas 347 toneladas.
Já os Estados Unidos importaram 4.575 mil toneladas do Brasil até a terceira semana de setembro/25, isso significa uma queda de 78% no comparativo anual, em que os americanos compraram 20.869 mil toneladas de carne bovina brasileira em setembro do ano anterior.
Em paralelo, as exportações paraguaias para os EUA cresceram 40% no mesmo período, evidenciando o papel do país como um hub de redistribuição regional. Analistas reforçam que, oficialmente, a triangulação direta da carne brasileira para os EUA não é permitida. O que ocorre, na prática, é a substituição: os vizinhos vendem sua própria carne aos americanos e importam do Brasil para manter o abastecimento interno.
O presidente da ABIEC (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes), Roberto Perosa, informou que os prejuízos causados pelas novas tarifas de importação devem ser menores que o previsto.
O executivo também negou a prática de triangulação para burlar as taxas. Segundo Perosa, o que ocorre é uma “oportunidade” de mercado. Ele explicou que o México, por exemplo, é um consumidor global de carne. O país pode usar a carne brasileira para suprir sua demanda interna e, ao mesmo tempo, exportar sua produção própria para os Estados Unidos.
O impacto desse rearranjo já aparece nas cotações. O boi gordo no Paraguai atingiu, na última semana, máxima histórica de US$ 71,70/@, acumulando 12 semanas consecutivas de alta, segundo a Scot Consultoria. O valor está US$ 14,64 acima da arroba brasileira, que segue como a mais barata entre os grandes players internacionais (US$ 57,43/@ na referência paulista).
Na Argentina, o boi gordo é negociado a US$ 62,5/@, também acima do nível brasileiro. Isso reforça a tese de que, mesmo penalizado pela tarifa, o Brasil permanece como fornecedor mais competitivo, servindo como “reserva de mercado” para os países vizinhos que precisam atender ao consumidor interno sem pressionar a inflação doméstica.
Segundo as informações da Agrifatto, o Brasil continua com a arroba de boi gordo mais barata entre os principais fornecedores do mercado internacional de carne bovina, chegando na semana passada a um valor médio de US$ 57,1/@,
Apesar do tarifaço, estimativas apontam que as exportações brasileiras de carne bovina podem crescer 10% em 2025, apoiadas justamente na demanda dos parceiros regionais.
“Não é que a carne brasileira esteja chegando aos EUA via triangulação. O que acontece é que Argentina e Paraguai vendem sua produção e, para recompor estoques internos, recorrem ao Brasil, que é a origem mais competitiva do mundo”, explica Rodrigo Costa, Analista da PINE Agronegócios e Contribuidor no TC Investimentos.
Para Isabella Camargo, zootecnista e analista da HN Agro, esse efeito dominó mostra a importância estratégica do Brasil: “O mundo depende da gente para comer. Mesmo diante de adversidades, o agro brasileiro encontra novos caminhos.”
A medida de Donald Trump, ao invés de enfraquecer os embarques de carne bovina do Brasil, acabou fortalecendo as exportações brasileiras. Para o mês de setembro, as expectativas são que as exportações alcancem um novo recorde no volume e no faturamento.