Nas academias e nas redes sociais, multiplicam-se corpos definidos e músculos volumosos. Ao lado da disciplina e da dieta, porém, cresce o uso de esteroides anabolizantes, muitas vezes vistos como um atalho para o corpo perfeito. O que poucos sabem é que, por trás dos ganhos estéticos, existe um custo biológico alto — e que nenhum tipo de supervisão médica elimina completamente o risco.
Nas academias e nas redes sociais, multiplicam-se corpos definidos e músculos volumosos. Ao lado da disciplina e da dieta, porém, cresce o uso de esteroides anabolizantes, muitas vezes vistos como um atalho para o corpo perfeito. O que poucos sabem é que, por trás dos ganhos estéticos, existe um custo biológico alto — e que nenhum tipo de supervisão médica elimina completamente o risco.
O que acontece no organismo
Os anabolizantes são derivados sintéticos da testosterona. Quando utilizados em doses acima das necessidades fisiológicas — algo comum em ciclos voltados ao ganho de massa muscular —, provocam uma série de alterações hematológicas e vasculares que comprometem o equilíbrio da circulação.
O uso de esteroides anabolizantes provoca aumento do hematócrito e da viscosidade do sangue, tornando-o mais espesso e propenso à formação de coágulos. Em paralelo, há uma elevação significativa do colesterol LDL — o “colesterol ruim” — e uma redução do HDL, o “colesterol protetor”, o que acelera o acúmulo de placas de gordura nas artérias. Essas substâncias também causam lesão no endotélio vascular, a camada interna que reveste os vasos e regula o fluxo sanguíneo, prejudicando o controle natural da coagulação. Além disso, induzem aumento da pressão arterial e espessamento do músculo cardíaco, sobrecarregando o coração, favorecendo arritmias e aumentando o risco de embolias. Somadas, essas alterações criam um terreno propício para tromboses, infartos e acidentes vasculares cerebrais, mesmo em indivíduos jovens e aparentemente saudáveis.
O risco independe da supervisão médica
Um erro comum é acreditar que o acompanhamento médico e os exames periódicos tornam o uso seguro. Estudos publicados em revistas científicas como Circulation, Stroke e Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism demonstram que, mesmo sob supervisão e com parâmetros laboratoriais aparentemente normais, o uso prolongado de testosterona e de seus derivados pode causar espessamento do sangue, inflamação dos vasos e disfunção endotelial.
Em outras palavras, o risco é inerente ao uso de doses suprafisiológicas, mesmo quando há monitoramento. Os efeitos ocorrem em nível celular e microvascular, e não há exames capazes de prever com precisão quem desenvolverá complicações graves.
O AVC dos jovens
O acidente vascular cerebral isquêmico acontece quando o fluxo de sangue para uma área do cérebro é interrompido, geralmente por um coágulo. Sem oxigênio, as células nervosas começam a morrer em minutos. Entre usuários de anabolizantes, o evento costuma surgir de forma súbita: fraqueza ou dormência em um lado do corpo, fala arrastada, perda de visão, tontura ou desequilíbrio.
Casos clínicos descritos na literatura médica relatam homens entre 20 e 40 anos, sem doenças prévias, que sofreram infartos cerebrais após ciclos de testosterona, trembolona, oxandrolona ou estanozolol. Em muitos deles, o hematócrito estava acima de 55% e o colesterol HDL extremamente baixo – alterações suficientes para desencadear uma trombose cerebral, mesmo em indivíduos jovens e fisicamente ativos.
O paradoxo da estética
O uso de anabolizantes cria um paradoxo evidente: enquanto melhora a aparência e o desempenho físico a curto prazo, deteriora silenciosamente o sistema vascular. Essas substâncias ampliam a força muscular, mas sobrecarregam o coração e comprometem a circulação. O resultado é um corpo aparentemente saudável, porém vulnerável a eventos graves.
Especialistas em endocrinologia e medicina esportiva alertam que não existe dose “segura” de anabolizantes quando o objetivo é puramente estético ou de performance, pois qualquer elevação crônica dos níveis hormonais acima do fisiológico já interfere no metabolismo cardiovascular.
A reversão é possível — mas nem sempre completa
A interrupção do uso pode normalizar parte das alterações laboratoriais em algumas semanas ou meses. No entanto, quando há um evento vascular, as sequelas costumam ser permanentes. Mesmo jovens que sobrevivem a um AVC podem apresentar déficits motores, dificuldade de fala, fadiga e alterações cognitivas, com impacto profundo na qualidade de vida.
Por isso, a prevenção deve vir antes da primeira aplicação. O uso recreativo de hormônios não é inofensivo: seus riscos vão muito além da estética.
Cuidar do corpo sem agredir o cérebro
Buscar saúde, força e autoestima é legítimo – mas deve ser feito com equilíbrio. Treinos bem planejados, alimentação adequada, sono de qualidade e avaliação médica em caso de suspeita de deficiência hormonal são caminhos seguros e eficazes.
A medicina esportiva moderna oferece alternativas seguras, mas nenhuma delas inclui o uso prolongado de hormônios em níveis tóxicos. O verdadeiro conceito de performance está em respeitar os limites do corpo e proteger o que ele tem de mais vital: o cérebro. Um físico pode ser reconstruído com esforço. Um cérebro lesionado, não.
Sinais de alerta de AVC (mesmo em jovens)
- Fraqueza ou dormência súbita em um lado do corpo
- Dificuldade para falar ou compreender palavras
- Perda súbita de visão em um ou ambos os olhos
- Tontura, desequilíbrio ou perda de coordenação
- Dor de cabeça súbita e muito intensa
Diante de qualquer desses sintomas, procure atendimento de emergência imediatamente. No AVC, cada minuto conta.

